sábado, 27 de junho de 2015

O CRIME DE FRAUDE CONTRA CREDORES PRATICADO PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS CONTRA AS EMPRESAS QUE PLEITEAM RECUPERAÇÃO JUDICIAL

O CRIME DE FRAUDE CONTRA CREDORES PRATICADO PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS CONTRA AS EMPRESAS QUE PLEITEAM RECUPERAÇÃO JUDICIAL




ARTHUR MIGLIARI JÚNIOR
Promotor de Justiça de Falências de São Paulo
Mestre em Direito Penal pela Universidade São Francisco.
Mestre em Direito Processual Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Extensão universitária em Recuperação de Empresas e Falências, pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Law)
Doutorando pela Universidade de Coimbra – Portugal na área de concentração: Direito Penal Econômico-Empresarial
Professor universitário e de cursos de pós-graduação lato sensu Coordenador Pedagógico do Instituto Phorte nas áreas de Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Internacional.
Co-Fundador do Instituto Brasileiro de Recuperação de Empresas e Falências (IBR) – SPaulo
Co-Fundador do Tournaround Management Association of Brazil – (TMA-Brazil) – SPaulo
Conselheiro da Revista Jurídica Justitia do Ministério Público do Estado de São Paulo e Associação Paulista do Ministério Público. 
Diplomado com o Mérito Internacional da Justiça, outorgado pelo Centro de Estudos do Direito Europeu, Portugal.





Desde a edição da Lei 11.101⁄2005 ficou estabelecido que todos os credores da empresa que pleiteia recuperação judicial ficam obrigados a participar do processo, desde que sejam relacionados como tais pela empresa em dificuldades econômicas.
Nos primórdios da referida legislação especial se estabeleceu que haveria uma dicotomia bem explícita, separando os credores sujeitos aos efeitos da recuperação e outros que não estavam sujeito a elas, estabelecidos no artigo 49, § 3º da Lei de Recuperação de Empresas e Falências (LRE - 11.101⁄2005), não obstante desde o início do processo devesse o devedor arrolar todos os seus credores, inclusive os credores tributários e aqueles que não participassem da recuperação, sendo essa, inclusive a jurisprudência dominante.[1]
Eventuais créditos fiscais também deveriam ser arrolados, podendo o Estado prosseguir nas suas execuções fiscais individuais movidas contra a empresa em recuperação.[2]
Em mais de uma oportunidade, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que formava-se um verdadeiro “juízo universal da recuperação”, vez que, mesmo com a continuação das execuções fiscais individuais, a venda de unidades produtivas isoladas, possíveis responsabilizações tributárias e o destino do dinheiro ali arrecadado teriam que ser mandados para o juízo universal da recuperação para solução do impasse, como se viu no julgamento do Ag.Reg. no CC. 116.036-SP, da 2ª. Seção do STJ, relatoria da Ministra Nancy Andrighi. Em outro aresto, o Superior Tribunal de Justiça, reiterou o posicionamento sobre o chamado juízo universal da recuperação judicial ao decidir o Ag.Reg. CC 112.638-RJ, de relatoria do Min. João Otavio de Noronha, julgado em 10 de agosto de 2011, publicado no DJe de 19⁄8⁄2011, decidindo pela competência universal da recuperação ante o juízo restrito do Fisco, na Vara Federal, que tenta se cobrar em execução fiscal.[3]

Por aí se pode presumir a qualificação especial do juízo da recuperação, tornado universal, a partir da obtemperação da rigidez legal pelos entendimentos pretorianos, onde estabeleceu a necessidade de vinculação do juízo universal com questões que lhes são próprias.
Estabelecidas esta primeira premissa necessária, a situação que se apresenta, no presente estudo, é que em diversas oportunidades pudemos constatar que várias instituições financeiras vêm buscando o Poder Judiciário para se locupletar ilicitamente de valores, em prejuízo dos credores da massa credora da recuperação judicial, lançando mão de meio jurídico específico, a fim de sair do processo recuperacional.
Como se sabe perfeitamente bem, o plano de recuperação judicial é um ato jurídico sujeito ao “controle dos credores” e sua aprovação gerou dezenas de controvérsias sobre sua natureza jurídica e sobre sua autonomia.
Após muito ouvir e pesquisar sobre o assunto constatei que o plano de recuperação pode ser considerado um verdadeiro negócio jurídico multilateral, de natureza novativa, pois faz extinguir as obrigações anteriores existentes, fazendo surgir novas obrigações, decorrentes da sua aprovação, obrigando os vencidos em assembleia geral de credores a se submeter à vontade dos vencedores, nos termos do artigo 59, § 1º da LRE. No entanto, em decorrência da defeituosa redação do artigo 61, da LRE, o Brasil criou uma espécie de novação sui generis, ou, genuinamente brasileira: vale apenas em parte, ou vale enquanto durar a recuperação, mas não vale se a empresa vier a falir!
Pois bem, o que me importa, no momento é que o plano homologado judicial se transforma num negócio jurídico multilateral novativo da recuperação judicial, transformando a relação jurídica anterior, agora estabelecendo novas bases de negócio, nova fórmula de pagamento e, principalmente, nova forma de pagamento, fazendo desaparecer a situação jurídica anterior.
Logo, se vários credores, em sua maioria, aprovaram um plano de recuperação judicial, e, com a homologação judicial desse plano, os demais credores, perdedores na votação ou ausentes na mesma votação, têm a obrigação de se submeter a esse plano aprovado, mesmo porque, se foram vencidos, significa que suas ideias não foram aceitas, por não interessar à maioria dos presentes; se ausentes, a situação dos mesmos é ainda pior, eis que durmientibus non sucurrit jus!
Diante dessa situação jurídica nova – na acepção jurídica do termo: novada – a regra anteriormente estabelecida deixa de existir. A pactuação envolvida no início das negociações não mais existem. As regras de atualização monetária, deixam de existir. A cobrança de juros, não mais pode ser efetiva. Tudo, enfim, se modificou com o plano de recuperação judicial aprovado em Assembleia Geral de Credores – criada pela Lei de Recuperação de Empresas e Falências (LRE - 11.101⁄2005).
Essa foi uma fórmula encontrada pelo legislador de 2005 para suprir a antiga e desgastada concordata preventiva – que se mostrou palco de seguidas fraudes e prejuízos consideráveis para os credores – tendo o legislador dito, em poucas palavras: vamos sentar numa mesa de negociação devedores e credores e resolver um problema que interessa a todos: recuperar uma empresa viável economicamente, mas que passa por um momento de instabilidade e, ainda, dar aos credores a oportunidade de receber seus créditos em novas condições e forma de pagamento.
Ora, tudo resolvido, homologado o plano de recuperação, não há mais possibilidade de que algum credor venha agir separadamente dos demais e passe a obter vantagens em prejuízo de todos os outros, que agora terão que suportar os ônus de um processo multifacetário.  
Estavam assim estabelecidos, todos justos e acordados.
No entanto, o que está ocorrendo, na prática, é muitas instituições financeiras vêm se locupletando pelas lacunas do Direito ou lacunas da lei para se furtarem do princípio da pars conditio creditorum.
Na prática, ao invés de se submeterem ao processo de recuperação, como todos os demais credores, vêm utilizando um expediente fraudulento, ao não pleitearem suas inclusões no rol dos credores apresentados ao juízo pelo devedor, mas, sim, ajuizarem demandas autônomas, baseadas na declaração de iliquidez das mesmas, previstas no artigo 6º, § 1º da LRE e, ainda, não pleitearem na recuperação judicial a reserva do entenderem de direito, nos termos do § 3º do mesmo artigo 6º da LRE.[4] 
Isto ocorre porque há um equívoco da LRE ao dizer, no art. 6o que o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso de todas as ações e execuções em face do devedor, ressalvando, porém, no § 1o que continuará em curso no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida. E, no § 3o diz que o juiz competente (rectius: aonde estiver processamento a ação) poderá determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, será o crédito incluído na classe própria.
Merece uma análise esta situação: primeiro, o juiz do foro competente para a ação que demandar quantia ilíquida não agirá ex-officio, dependendo de provocação das partes, dado o seu caráter de inércia processual e, somente oficiará ao juízo da recuperação se alguma das partes se lembrar dessa situação.
Evidentemente, as instituições financeiras não se dão ao trabalho de provocar o juízo de origem da existência de recuperação judicial do devedor, mesmo porque isto levantará, no mínimo, uma verificação sobre a situação do processo recuperacional e, quiçá, a chamada aos autos do administrador judicial e do Ministério Público, órgãos que são fiscalizadores do princípio da pars conditio creditorum mitigado da recuperação judicial.
Aí que vem o “x” da questão.
Estando o crédito relacionado na petição inicial da recuperação judicial onde o devedor reconhece o débito exequendo, não poderia a instituição financeira ajuizar, ou prosseguir, maliciosamente, com a ação proposta ou a propor, motivo pelo qual tanto o administrador judicial como o Ministério Público tem a obrigação de velar por essa observação inicial, e, constatando que o crédito já consta do plano de recuperação judicial, no mínimo, têm que comunicar o juízo recuperacional, sobrestando o andamento da execução ou monitória em fase de execução.
É que não existe um cumprimento efetivo dos Cartórios e dos Juízos que não são da recuperação judicial e, muito menos destes, sobre a obrigatoriedade estabelecida no art. 6º, § 6º, de comunicação periódica das ações propostas contra as empresas em recuperação, em face da ausência total de penalidade imposta a quem não cumpre a determinação, passando a se constituir em verdadeira letra morta da lei[5].
Por meio dessa norma não cumprida as instituições financeiras cuidam de propor ações ordinárias, ações monitórias, ações indenizatórias, ações de conhecimento, ações de constituição de dívidas, etc. em face das empresas em recuperação judicial, alegando que não podem ser colocadas nos processos moratórios, eis que se encontram nas exceções previstas na LRE – isto quando alegam essa minúcia.
Na imensa maioria das vezes, ajuízam demandas que não deveriam ter sido ajuizadas, a fim de se valer de manobras jurídicas para se desvencilhar dos processos de moratória.
Porém, cumpre ao Poder Judiciário, secundado pelo Ministério Público e pelo Administrador Judicial impedir que isso ocorra, em face dos mecanismos tomados da própria Lei de Recuperação de Empresas e Falências (LRE - 11.101⁄2005).
É que dispôs o artigo 51 da Lei de Recuperação de Empresas e Falências (LRE - 11.101⁄2005) que o devedor deverá descrever todos os percalços da empresa em necessidade para pleitear a moratória e, ainda, arrolar todos os credores que deverão concorrer ao juízo universal da recuperação.[6]
Como se percebe das disposições legais inscritas no art. 51 da LRE é obrigação do devedor esclarecer o juízo quem são seus credores e, mais, deixar claro aos demais credores a quem o requerente da recuperação judicial deve, pois, em tese, os demais credores não têm obrigação de saber a quem o requerente deve, mesmo porque não podem se imiscuir nas contas de terceiros.
Isto tem uma conotação real, pois a partir do momento em que cada devedor tenha conhecimento exato das dívidas do devedor e, observando o plano de recuperação judicial elaborado é que poderá cada um dos credores se posicionar sobre a possibilidade real de êxito da recuperação, ou, em sentido contrário, tratar-se de mera aventura jurídica do devedor, cuja falência se anuncia para breve e tem apenas mais uma vã tentativa de fôlego de moribundo.
É crucial que o devedor arrole todos os credores, inclusive aqueles débitos não sujeitos aos efeitos da recuperação, como os constantes do art. 49, § 3º da LRE e os débitos fiscais, em face da possibilidade de prosseguimento destas ações envolvendo possíveis ativos financeiros da empresa recuperanda e a exclusão de garantias dos credores.
Assim, quem arrola seus credores é o devedor e, a partir do momento em que o juiz defere o pedido de processamento da recuperação, nos termos do artigo 52 da LRE[7], não haverá possibilidade de um credor tentar sair do processo recuperacional, a não ser pela forma de impugnação de crédito, onde provará não é credor submetido aos efeitos da recuperação, tanto assim que a LRE faculta a tais credores, indevidamente inscritos como sujeitos aos efeitos da recuperação, utilizar os meios jurídicos a seu dispor, conforme artigos 8º, 11, 13 e 19 da LRE[8].
Tais dispositivos legais geraram jurisprudência a respeito daqueles créditos submetidos aos efeitos da recuperação e outros que não são incluídos na recuperação.
No Agravo de instrumento 384223020128260000 SP 0038422-30.2012.8.26.0000, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, tendo como relator o Des. Pereira Calças, ficou decidido que os créditos existentes na data do pedido de processamento da recuperação devem se submeter à recuperação judicial[9].
Na Justiça Federal, também ficou decidido que empresas públicas têm que se submeterem aos planos de recuperação de empresas, conforme decidido na AC 425065 PE 0007886-30.2005.4.05.8300, tendo como relator o Des. Federal Francisco Barros Dias, conforme julgamento de 27 de outubro de 2009[10].
Também restou decidido no AI 70022910947-RS, da 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tendo como Relator o Des. Angelo Maraninchi Giannakos, julgado em 21 de janeiro de 2008, que todos os credores se submetem ao plano de recuperação judicial, quando o devedor assim o declara[11].
A toda evidência, não existindo o crédito, no momento da propositura da recuperação judicial, não há que se falar em submissão ao plano de recuperação judicial, mesmo porque seria impossível incluir na recuperação – e, posteriormente, no plano de recuperação – algo inexistente, conforme decidido no AgRg no AREsp 468895-MG 2014⁄0019341-1, Relator Min. Marco Buzzi, julgamento de 06 de novembro de 2014, da 4ª Turma do STJ, DJe de 14⁄11⁄2014.[12]
Em outro brilhante julgamento o mesmo Superior Tribunal de Justiça já havia decidido que é impossível que a empresa em recuperação judicial faça um plano exclusivo a um credor, por mais especial que este seja.[13]

Ora, colocadas essas premissas, o importante é destacar que Lei 11.101⁄2005 explicitou de maneira bastante clara e objetiva a forma e a maneira de se incluir e excluir credores do plano de recuperação judicial. Não há outro meio.
Primeiro, se o devedor incluiu credor que não o era, compete aos demais credores apresentaram recurso adequado, qual seja, a impugnação do crédito, com base no artigo 8º da LRE, sendo esta a única forma de se excluir crédito inexistente, forjado, capcioso, contestado, ou não fundamentado.  
De outro lado, se o devedor incluir crédito que não espelha a realidade, comete o crime previsto no artigo 172, caput, da LRE. Se houver conluio entre o devedor e o credor, este responde pelo crime do artigo 172, parágrafo único, da LRE.[14]
Segundo, se o credor se vê incluído num pedido de recuperação judicial, mas possui crédito previsto na forma do artigo 49, § 3º da LRE, também utilizará a impugnação de crédito, pleiteando sua exclusão, já que possui condições de prosseguir com sua execução ou ação em andamento.
As duas formas de exclusão são claras e precisas, podendo inclusive ser produzida prova da existência ou inexistência da circunstância que inclua ou exclua um credor da recuperação judicial.
Entretanto, várias instituições financeiras vêm, artificialmente promovendo ações fictícias – do ponto de vista de seu direito – afirmando que, por não possuir liquidez imediata, não estariam vinculadas ao plano de recuperação judicial, eis que o momento da sua inclusão à recuperação se daria quando do ajuizamento da recuperação, mas, como a quantia era ilíquida, estaria fora do alcance do plano.
Porém, o que fazem questão de “esquecer” é que a Lei 11.101, de 2005, criou mecanismos específicos para incluir e excluir credores, sendo que todos os credores a ela se submetem, em face do princípio maior da universalidade do juízo recuperacional, que tem maior poder de conhecimento que outros juízos, mesmo aqueles que não estão na vala comum do processo recuperacional.  
Logo, se o devedor incluiu credor na sua petição inicial, não há outra forma de o credor contestar essa inclusão: tem que usar a impugnação do processo recuperacional. Se não o fez a tempo e a forma adequados pela Lei 11.101, de 2005, está incluído no plano de recuperação e, uma vez aprovado o plano, a ele é obrigado se submeter, eis que haverá novação de sua dívida.
Mais uma vez prevalece a máxima de direito dormientibus nun sucurrit jus! Se houve novação da dívida da empresa em recuperação para um grupo de credores e uma das instituições financeiras não acorreu à assembleia geral de credores e não contestou o plano, seu crédito, também, faz parte da novação. E, portanto, não pode tentar executá-lo de maneira isolada.
E o único local apto para a discussão sobre o seu crédito é do juízo recuperacional. Nesse aspecto, já se encontra sacramentado pelo Superior Tribunal de Justiça que a competência é do juízo universal da recuperação, assim como no Enunciado 74 do CJF já se posicionou no sentido de que, embora possa prosseguir uma execução fiscal, qualquer disposição de bem da empresa em recuperação judicial tem que ser pedido no juízo universal da recuperação.
A situação que se vislumbra, então, diante da doutrina qualificada e da jurisprudência já sedimentada é que o juízo universal da recuperação é um juízo que deverá decidir sobre todos os bens da empresa em recuperação, procurando intervir tanto nos planos de recuperação judicial apresentados, fazendo o chamado controle da legalidade, assim como nas deliberações sobre alienação de bens, sempre velando pela efetiva função social da empresa e a sua inquestionável contribuição para o bem comum.
A forma como se tem comportado várias instituições financeiras, nos últimos anos, tentando maquiar situação existente e legal, ajuizando demandas imaginárias e fictícias, tentando excluir de apreciação do juízo universal da recuperação créditos que deveriam ter submetidos ao referido juiz, nos faz refletir para que o Ministério Público passe a adotar medidas judiciais duras, eis que, ao menos à primeira vista, se trata de uma fórmula de fraude a credores inclusive previsto no crime na fórmula genérica do artigo 168, caput, da LRE, pois assim o credor teria uma forma de vantagem econômica em prejuízo de terceiros, no caso, os demais credores, assim como o devedor, afligindo uma ação em que teria que se compor rapidamente com a instituição financeira, em prejuízo de todo o planejamento econômico que havia feito para suportar os ônus de um processo recuperacional. Além disso, a imposição de pesadas multas pelo Poder Judiciário às instituições financeiras que burlam a legislação federal deveria ser muito bem vinda, mas que não se têm visto, por força da benevolência de juízes com as mesmas, limitando-se geralmente a apenas fixar as verbas sucumbenciais.

Concluindo, é preciso que as instituições financeiras cumpram os ditames da Lei de Recuperação de Empresas e Falências (Lei 11.101, de 2005) observando que não há campo para que outros juízos intervenham em seus créditos, a não ser o juízo universal da recuperação, devendo os membros do Ministério Público exercer maior iniciativa de natureza penal, quando se depararem com situações em que exista clara e evidente má-fé de instituições financeiras, chamando os procuradores para a responsabilidade penal, eis que são eles os detentores e possuidores de conhecimento suficiente para saber quando e onde ajuizar as reclamações e, finalmente, que o Poder Judiciário passe a aplicar pesadas e sentidas multas, pelas litigâncias de má-fé das instituições financeiras.





[1] No AgReg. No AREsp. 468.895-MG, Rel. Min. Marco Buzzi, a 4ª Turma do STJ decidiu que a lei manda que se relacione todos os créditos, inclusive os tributários e aqueles não sujeitos aos efeitos da recuperação, como a propriedade fiduciária, o arrendamento mercantil, o direito real de garantia, a compra e venda com reserva de domínio, os contratos de ACCs (travas bancárias): julg. 06 de novembro de 2014, DJe 14⁄11⁄2014.
[2] Nesse sentido: AgRg no CC 136130 / SP - AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA 2014/0245786-8: Relator ANTONIO CARLOS FERREIRA: 
AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO FISCAL E RECUPERAÇÃO JUDICIAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL. EDIÇÃO DA LEI N. 13.043, DE 13.11.2014. PARCELAMENTO DE CRÉDITOS DE EMPRESA EM RECUPERAÇÃO. JURISPRUDÊNCIA MANTIDA.
1. O juízo onde se processa a recuperação judicial é o competente para julgar as causas em que estejam envolvidos interesses e bens da empresa recuperanda.
2. O deferimento da recuperação judicial não suspende a execução fiscal, mas os atos de constrição ou de alienação devem-se submeter ao juízo universal. Jurisprudência.
3. A Lei n. 11.101/2005 visa à preservação da empresa, à função social e ao estímulo à atividade econômica, a teor de seu art. 47.
4. No caso concreto, a edição da Lei n. 13.043/2014 – que acrescentou o art. 10-A à Lei n. 10.522/2002 e disciplinou o parcelamento de débitos de empresas em recuperação judicial – não descaracteriza o conflito de competência.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.

[3] PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO DE DIREITO DE VARA EMPRESARIAL. JUÍZO FEDERAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. EXECUÇÃO FISCAL. ALÇADA DA SEGUNDA SEÇÃO. ART. 9º, § 2º, IX, DO RISTJ. NULIDADE DE DECISÃO DO RELATOR. ARGUIÇÃO IMPRÓPRIA E DESCABIDA. ALIENAÇÃO DE UNIDADE PRODUTIVA, VIA LEILÃO JUDICIAL, NO PROCESSO DE RECUPERAÇÃO. AUSÊNCIA DE SUCESSÃO DO ARREMATANTE. ARTS.
60 E 141 DA LEI N. 11.101/2005. CONSTITUCIONALIDADE PROCLAMADA PELO STF (ADI N. 3.934-2/DF). CONFLITO CONHECIDO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA VARA EMPRESARIAL.
1.  Estabelecido com base no art. 115, I, do CPC conflito de competência entre Juízo de vara empresarial e Juízo federal, fundado em pronunciamentos conflitantes sobre a sucessão de arrematante, em alienação judicial, nas obrigações de empresas em procedimento de recuperação judicial, é nítida a alçada da Segunda Seção para apreciar o incidente processual, conforme a regra contida no art. 9º, § 2º, IX, do RISTJ.
2. É imprópria e descabida a arguição de nulidade de decisão do relator fundada nas mesmas razões de anteriores decisões em casos semelhantes, várias delas amparadas em parecer do Ministério Público Federal e objeto de julgamento e confirmação pela Segunda Seção na via recursal de embargos de declaração e de agravo regimental.
3. O juízo responsável pela recuperação judicial detém a competência para dirimir todas as questões relacionadas, direta ou indiretamente, com tal procedimento, inclusive aquelas que digam respeito à alienação judicial conjunta ou separada de ativos da empresa recuperanda, diante do que prescrevem os arts. 6º, caput e § 2º, 47, 59 e 60, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005. 
4. Como consectário lógico e direto dos pressupostos e alcance da Lei de Recuperação de Empresas e Falência, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI n. 3.934-2/DF, proclamou a constitucionalidade dos arts. 60 e 141 da referida lei.
5. Decidido anteriormente pelo Juízo de Direito, nos autos da recuperação judicial, que o adquirente de unidade produtiva via alienação naquele processo não responderia pelas obrigações do devedor (art. 60, parágrafo único, da Lei n. 11.101/2005), tal deliberação sobrepõe-se a qualquer decisão sobre a matéria advinda de juízos diversos, sob pena de inibição do propósito tutelar e da operacionalidade do mencionado diploma legal.
6. Agravo regimental desprovido.

[4] Art. 6o A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
§ 1o Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.
§ 2o É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o art. 8o desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.
§ 3o O juiz competente para as ações referidas nos §§ 1o e 2o deste artigo poderá determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, será o crédito incluído na classe própria.

[5]§ 6o Independentemente da verificação periódica perante os cartórios de distribuição, as ações que venham a ser propostas contra o devedor deverão ser comunicadas ao juízo da falência ou da recuperação judicial:
I – pelo juiz competente, quando do recebimento da petição inicial;
II – pelo devedor, imediatamente após a citação.

[6]  Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:
I – ... II – ...
III – a relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente;
IV – ...  V – ... VI – ... VII – ... VIII – ...
 IX – a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados.


[7] Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:
I – ... II – ...
III – ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do art. 6o desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos §§ 1o, 2o e 7o do art. 6o desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos §§ 3o e 4o do art. 49 desta Lei;

[8] Art. 8o No prazo de 10 (dez) dias, contado da publicação da relação referida no art. 7o, § 2o, desta Lei, o Comitê, qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público podem apresentar ao juiz impugnação contra a relação de credores, apontando a ausência de qualquer crédito ou manifestando-se contra a legitimidade, importância ou classificação de crédito relacionado.
Parágrafo único. Autuada em separado, a impugnação será processada nos termos dos arts. 13 a 15 desta Lei.
Art. 11. Os credores cujos créditos forem impugnados serão intimados para contestar a impugnação, no prazo de 5 (cinco) dias, juntando os documentos que tiverem e indicando outras provas que reputem necessárias.
Art. 13. A impugnação será dirigida ao juiz por meio de petição, instruída com os documentos que tiver o impugnante, o qual indicará as provas consideradas necessárias.
Parágrafo único. Cada impugnação será autuada em separado, com os documentos a ela relativos, mas terão uma só autuação as diversas impugnações versando sobre o mesmo crédito.
Art. 19. O administrador judicial, o Comitê, qualquer credor ou o representante do Ministério Público poderá, até o encerramento da recuperação judicial ou da falência, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, pedir a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, nos casos de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro-geral de credores.
§ 1o A ação prevista neste artigo será proposta exclusivamente perante o juízo da recuperação judicial ou da falência ou, nas hipóteses previstas no art. 6o, §§ 1o e 2o, desta Lei, perante o juízo que tenha originariamente reconhecido o crédito.
§ 2o Proposta a ação de que trata este artigo, o pagamento ao titular do crédito por ela atingido somente poderá ser realizado mediante a prestação de caução no mesmo valor do crédito questionado.

[9] Recuperação judicial. Suspensão das ações e execuções pelo período de 180 dias. Aprovação de plano de recuperação judicial em assembleia-geral de credores. Submissão de todos os créditos sujeitos à recuperação ao plano homologado. Natureza contratual do plano de recuperação. Créditos trabalhistas. Ilegitimidade e falta de interesse de agir do agravante. Agravo a que se nega provimento. Julgamento em 02 de outubro de 2012.

[10] PROCESSO CIVIL. CIVIL. ECT. ISENÇÃO CUSTAS. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SUBMISSÃO DO CRÉDITO AO PLANO DE RECUPERAÇÃO. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. HABILITAÇÃO DO CRÉDITO NO JUÍZO QUE DECRETOU A RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
1. Hipótese de apelação contra sentença que extinguiu a execução de título extrajudicial, ante a perda superveniente do seu objeto e determinou a imediata expedição de ofício ao Juízo da 1ª Vara de Falência e Recuperação Judicial da Comarca de São Paulo para habilitação dos créditos arrolados na peça vestibular.
2. No que pertine a isenção de custas processuais, merece amparo a alegação da ECT, por encontrar o pedido amparo no Decreto-lei 509/69, art. 12, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, conforme decisão do STF no julgamento do RE nº 220.906-9/DF. Precedentes.
3. Dispõe o art. 59 da Lei 11.101/05 que "o plano de recuperação judicial implica a novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no parágrafo 1º, do art. 50 desta Lei".
4. A aprovação do plano de recuperação implica novação dos créditos anteriores ao pedido. Assim, a novação extingue uma dívida para que este débito seja incluso no plano judicial. Com o deferimento do pedido de recuperação e homologação do plano de recuperação, a dívida anterior é extinta e o débito será pago de acordo com o plano de recuperação judicial, que deve ser aprovado por todos os credores.
5. O crédito da Exequente se inclui no referido Plano, visto que não tem natureza trabalhista ou fiscal.
6. Quanto ao pedido alternativo para que seja oficiado o juiz da 1ª Vara de Falências e Recuperação Judicial da Comarca de São Paulo para habilitação dos créditos arrolados na peça vestibular, referida determinação já consta do dispositivo da sentença atacada, falecendo de interesse de agir o Apelante neste ponto.
7. Apelação parcialmente provida apenas para determinar a isenção da ECT do pagamento das custas processuais, nos termos do art. 12 do Decreto-lei 509/69.
Fonte: Diário da Justiça Eletrônico - Data: 12/11/2009 - Página: 517 - Nº: 48 - Ano: 2009

[11] AGRAVO DE INSTRUMENTO. VARIG S/A RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SUBMISSÃO DO CRÉDITO AO PLANO DE RECUPERAÇÃO. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos que se tenha contra o devedor recuperando, inclusive aqueles anteriores ao pedido de recuperação judicial. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO. (Agravo de Instrumento Nº 70022910947, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angelo Maraninchi Giannakos, Julgado em 21/01/2008)

[12] AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC)- EMBARGOS À EXECUÇÃO - CRÉDITO CONSTITUÍDO APÓS O DEFERIMENTO DO PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL - NÃO SUBMISSÃO AO PLANO - RECURSO ESPECIAL NÃO ADMITIDO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA EXECUTADA.
1. De acordo com o art. 49 da Lei nº 11.101/2005, apenas os créditos existentes na data do pedido estão sujeitos à recuperação judicial. Assim, créditos posteriores ao pleito recuperacional não se submetem aos seus efeitos. Precedentes.
2. A agravante não impugnou, de forma específica e detalhada, os fundamentos da decisão agravada, limitando-se a repetir o teor do seu apelo nobre. Incide ao caso, pois, o enunciado nº 182 da Súmula do STJ: "é inviável o agravo de art.545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada".
3. Agravo regimental desprovido.

[13] RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 30.686 - SP (2009/0134996-1) RELATOR : MINISTRO MASSAMI UYEDA.
RECURSO ORDINÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - PARTE DO ACÓRDÃO QUE DENEGOU A ORDEM IMPETRADA - PRETENSÃO DE OBTER DA EMPRESA-RECUPERANDA PLANO QUE CONTEMPLE INDIVIDUALMENTE SEUS CRÉDITOS - INADMISSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO - INOBSERVÂNCIA DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL - CONVOLAÇÃO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL EM FALÊNCIA - RECURSO IMPROVIDO.
I - O Plano de Recuperação Judicial, em que se discrimina, de forma pormenorizada, o modo como se dará o soerguimento e a reestruturação da empresa combalida, bem como a viabilidade econômica desta, com a avaliação de seus bens e ativos e a consecução de laudo econômico-financeiro, consubstancia o principal instrumento para que o processo de Recuperação Judicial, num esforço comum dos credores, da empresa e da sociedade em geral, obtenha êxito, mantendo-se, por conseguinte, o prosseguimento da atividade econômica;
II - O Plano de Recuperação Judicial apresentado pela empresa-devedora deve ser necessariamente submetido à apreciação da Assembléia Geral de Credores, o qual, se aprovado, por deliberação que bem atenda ao quórum qualificado da lei, será judicialmente homologado e, tornar-se-á, em princípio, imutável. Uma vez aprovado o plano de recuperação judicial, todos os credores a ele se submetem, independente de discordância ou, como in casu, de inércia do credor;
III - Submetido o Plano de Recuperação à apreciação da Assembléia Geral de Credores, a Lei n. 11.101/2005 (artigos 45 c.c 41), para efeito de aprovação do Plano, distingue os credores por classes, a considerar a natureza de seus créditos. Portanto, é justamente por meio do quórum qualificado da Lei que os credores, a considerar a natureza de seus créditos, detêm maior ou menor influência na aprovação do Plano.
IV - A natureza do crédito, seja ele privilegiado ou não, não confere ao seu titular a prerrogativa de obter um plano que contemple individualmente seus créditos. Tal pretensão, aliás, se admitida, teria o condão de subverter o processo de recuperação judicial, já que o plano de reorganização da empresa deve, para seu êxito, contemplar, conjuntamente, todos os débitos da recuperanda;
V - A não implementação do que restou aprovado no Plano de Recuperação Judicial pela empresa-beneficiada tem como conseqüência a legitimação do credor para pedir a falência, e não, como pretende o ora recorrente, obrigar a recuperanda a apresentar um plano específico para proceder ao pagamento de seus créditos;
VI - Recurso Ordinário improvido.
Brasília, 07 de outubro de 2010(data do julgamento) MINISTRO MASSAMI UYEDA Relator, 3ª Turma do STJ.

[14] Art. 172. Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre o credor que, em conluio, possa beneficiar-se de ato previsto no caput deste artigo.

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