terça-feira, 9 de agosto de 2016

Recuperação judicial - indevida cobrança de Imposto de Renda - inconstitucionalidade

A indevida cobrança de Imposto de Renda em face da homologação da aprovação do plano de recuperação judicial com descontos

A fúria arrecadatória estatal é algo que beira o confisco.
O Fisco como sempre pretende tributar as empresas em busca de alguma forma de obter vantagem, mesmo nos lugares que não há vantagem alguma para as empresas, mormente aquelas que estão em recuperação judicial e, portanto, debilitadas economicamente, precisando do amparo judicial para continuarem suas atividades.
Porém, o Fisco não pensa em auxiliar, mas percebe uma possibilidade de tributação onde não existe qualquer enriquecimento ou acumulação de riquezas.
Conforme já expusemos anteriormente, a homologação da decisão da assembleia de credores ou a simples homologação do plano de recuperação judicial, sem que tenha ocorrido a assembleia de credores deve ser considerada como uma decisão judicial modificativa da condição do credor. Entretanto, o diferimento do eventual crédito ou débito se dará nas condições em que vir a ser definida no plano de recuperação judicial, para acerto futuro, isto é, para se ver realizado no futuro, este futuro previamente estipulado, porém, incerto.
Daí porque entendemos que é possível o Fisco se louvar no disposto no artigo 340 do RIR – Regulamento de Imposto de Renda, com base na Lei 9.430, em especial o artigo 9º e seus parágrafos, posto é totalmente inconstitucional, eis que não existe ainda a data efetiva e real para a base tributária. Sim, porque a situação é muito peculiar.
Primeiro, não se pode falar em lucro do empresário endividado e que procura o Poder Judiciário para obter uma moratória, quando esta é a única condição que possui para discutir com seus credores – mormente bancos ávidos por recebimento seus felpudos lucros – em igualdade de condições.
Segundo, não se pode falar em lucro se o empresário obtém dos credores um abatimento porcentual de sua dívida, mediante o pagamento futuro de valores, sendo que esses valores são condicionados a ocorrências de tempo e modo de pagamento.
Terceiro, com o diferimento do tempo e modo de pagamento, em futuro incerto e totalmente condicionado a situações que somente ocorrerão naquela época, é torna impossível falar-se em fato gerador que tornaria obrigatório o pagamento de Imposto de Renda.
Mais, impossível falar-se em renda, como deseja a Receita Federal, que entende que a novel situação da empresa recuperanda apresenta benefício financeiro e, por essa razão, estaria sujeita a tributação, apenas por uma engenharia financeira da Receita, através das normas contábeis introduzidas pelas Leis 11.638/2007 e 11.941/2009, de contestável constitucionalidade, ou melhor, de inconstitucionalidade flagrante!
O entendimento da Receita Federal é no sentido de que o plano de recuperação judicial enseja uma redução da dívida, o que para o Fisco representa, de algum modo, a diminuição do seu passivo e, por tais razões, geraria uma lucratividade da empresa e, destarte, passível de cobrança do Imposto sobre a Renda, pois, com base nas novas medidas contábeis obrigatórias lançadas pela União, não resta ao empresário qualquer outro espaço senão lançar a possível redução conta contábil, cujo resultado será identificado pela União como aumento do patrimônio líquido da empresa, quando isto jamais ocorreu!
Exemplificando, se uma empresa tem um passivo de R$ 10.000,00 e obtém junto aos seus credores um plano de recuperação que aplica redução linear de 50% do passivo, resultará num passivo final de R$ 5.000,00. Na ausência de local para se lançar o percentual de redução da dívida originária se encontra na chamada alteração do Patrimônio Líquido (PL) da empresa, previsto no artigo 182 § 3º d da Lei 6.404/76, com redação dada pela Lei 11.941, de 2009[1].
Ora, a União, por meio de um meio artificial passou a tributar a alteração do plano de recuperação judicial – frise-se, ainda não cumprido, posto que se trata de condição futura e incerta – contrariando a Constituição Federal, em específico o artigo 153, inciso III, dando uma nova interpretação ao que se deve entender por “renda e proventos”.
Mais, também é indevido o Imposto de Renda no caso de aprovação de plano de recuperação judicial, eis que a Lei 11.941, de 2009 contrariou flagrantemente os princípios da generalidade, da universalidade e da progressividade, previsto no § 2º inc. I, do mesmo artigo 153 da Constituição Federal.
Ora, em hipótese alguma se pode dizer que a redução de dívida do empresário seja passível de tributação, eis que não se encontra no fenômeno constitucional de auferimento de riqueza, mas, ao revés, de uma situação dramática de redução de seu passivo, por meio de um encontro de intenções, futuras e incertas, deixe-se bem claro isto, que só se esvairá se houver efetivamente pagamento do passivo por parte do devedor em recuperação judicial.
Logo, a fórmula mirabolante do Fisco de criar renda onde não existe está fadada à declaração de sua inconstitucionalidade. Também não se pode dizer que é rendimento ou provento de qualquer natureza, já que nada foi auferido, nada foi pago, ainda, bem como nada existiu de concreto. Há apenas uma expectativa de direito futuro para ambos os lados – devedor e credores – sem que se tenha alteração substancial da condição da dívida.
De outro lado, sem que tenha existido um real cumprimento do plano econômico do devedor não se pode afirmar que exista um valor “x” para ser efetivamente pago, eis que este valor poderá ser quitado em meses ou anos, na forma do acordo coletivo da A.G.C.
E uma última consideração mostra a falibilidade da cobrança de imposto de renda sobre a renegociação das dívidas, na forma do art. 61, § 2º da Lei 11.101/2005. Somente é válida a renegociação da dívida se esta for efetivamente cumprida pelo devedor. Se este não vier a cumprir o plano de recuperação judicial, originando sua quebra, as condições anteriormente pactuadas tornarão ao status quo ante e, destarte, tudo o que se negociou estará automaticamente desfeito, vez que estamos de uma novação condicional e suspensiva dos negócios inicialmente existentes.
Logo, a cobrança de imposto de renda é manifestamente inconstitucional e ilegal, fruto de uma fúria atroz do Estado para bancar suas sandices econômico-financeiras, sendo que o Supremo Tribunal Federal declarar sua inconstitucionalidade ad futurum.




[1] Art. 182. A conta do capital social discriminará o montante subscrito e, por dedução, a parcela ainda não realizada.
§ 1º Serão classificadas como reservas de capital as contas que registrarem:
a) a contribuição do subscritor de ações que ultrapassar o valor nominal e a parte do preço de emissão das ações sem valor nominal que ultrapassar a importância destinada à formação do capital social, inclusive nos casos de conversão em ações de debêntures ou partes beneficiárias;
b) o produto da alienação de partes beneficiárias e bônus de subscrição;
§ 2° Será ainda registrado como reserva de capital o resultado da correção monetária do capital realizado, enquanto não-capitalizado.
§ 3o  Serão classificadas como ajustes de avaliação patrimonial, enquanto não computadas no resultado do exercício em obediência ao regime de competência, as contrapartidas de aumentos ou diminuições de valor atribuídos a elementos do ativo e do passivo, em decorrência da sua avaliação a valor justo, nos casos previstos nesta Lei ou, em normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, com base na competência conferida pelo § 3o do art. 177 desta Lei. 
§ 4º Serão classificados como reservas de lucros as contas constituídas pela apropriação de lucros da companhia.
§ 5º As ações em tesouraria deverão ser destacadas no balanço como dedução da conta do patrimônio líquido que registrar a origem dos recursos aplicados na sua aquisição.