domingo, 15 de novembro de 2015

Entenda o que é o TRUST

Entenda o que é o TRUST


Originado na Inglaterra, por volta do Século XI e ainda em plena vigência nos países anglo-saxões, no entanto, é muito pouco difundido nos países latinos e em outros continentes, passa a ser alvo de diversas investigações criminais, visando conhecer e o verdadeiro autor de eventual delito, geralmente envolvendo grandes somas de dinheiro de origem criminosa.
De fato, o trust possui uma organização gerencial (management organization) com roupagem jurídica díspare das pessoas que a compõem passa a ser tratada como um ente diverso daqueles que a criaram e a constituíram.
A história registra que na segunda metade do Século XIX e início dos anos 1900, notadamente nos Estados Unidos da América do Norte, com os grandes impérios monopolísticos de Vanderbilt, Rockfeller, Carnegie, J.P. Morgan, Ford, gerou a necessidade do governo estadudinense intervir nos mesmos, criando os crimes de trustes, principalmente a partir de Theodore Rossevelt, ferrenho combatente dos monopólios americanos, em face da enorme concentração de riqueza nas mãos de uns e da pobreza de milhões.
Definindo, haverá o trust quando uma pessoa (settlor[1] ou grantor) transfere seu patrimônio (trust fund), total ou parcialmente, para um terceiro – que poderá ser pessoa física ou jurídica (trustee) - com a incumbência de gerir e administrar o patrimônio e distribuir os lucros e dividendos de acordo com as determinações impostas pelo settlor.
De todos os modelos empresariais existentes ao derredor do mundo creio que o trust é aquele em que a possibilidade de real punição dos culpados, quando se objetiva atingir a pessoa jurídica é o que menos inspira certeza na sua efetiva realização.
Isto ocorre porque, baseando-se o trust numa confiança entre as partes, o instituidor do trust (settlor) não aparecerá nas transações encetadas pelo trustee, eis que, pela sua própria natureza, nada mais é do que o cumpridor de ordens emanadas do contratante (settlor), podendo o missionário das ordens do instituidor realizá-las em seu nome, sem que jamais apareça o verdadeiro autor de um crime e seu mentor intelectual.
Se o trustee resolver montar uma empresa em qualquer parte do mundo - independente do modelo societário que escolher - a eventual punição da pessoa jurídica alcançará exclusivamente o cumpridor das ordens do settlor sendo que a punição, destarte, será meramente formal, equidistante dos altos interesses sociais e dogmáticos que se teve em mente para a punição dos efetivos autores dos delitos.
Por negociar em seu próprio nome o trustee aparece diretamente nos negócios da empresa - que poderá ser criada exclusivamente para o fim de praticar crimes, verbi gratia - e eventual condenação criminal, inclusive pelo concurso de pessoas, atingirá somente sua pessoa, isentando-se por completo o instituidor do trust, mesmo porque, em regra, ele não teria cometido qualquer delito, podendo até alegar que o trustee agiu com excesso de mandato e, portanto, ser responsabilizado exclusivamente, civil e criminalmente.
Destarte, para a perfeita equalização da busca dos verdadeiros autores dos delitos, em caso de um trust, só resta perseguir detalhadamente os meandros da possível ocorrência do mesmo, eis que não existirá prova abundante de sua ocorrência, como sói acontecer com os tipos societários ordinários, mesmo porque a característica principal do trust é exatamente a de esconder ao máximo sua existência.
Dentre as empresas criminosas, no mais das vezes constituídas exclusivamente para a prática de crimes, a escolha pela movimentação de dinheiro é baseada no modelo do trust, sendo que os "proprietários" dessas empresas são apenas "homens de palha" ou "laranjas" encarregados de cumprir as ordens emanadas dos seus superiores e a eventual punição dos membros de um trust também se me afigura meramente formal, eis que sempre será preciso encontrar os verdadeiros autores dos delitos, mesmo porque a punição representará somente a perda de uma unidade de um esquema criminoso, que, como uma bactéria, imediatamente se reúne para a constituição de novo modelo empresarial criminoso.
Em decorrência dessa característica principal, fácil concluir que o descortinamento na pessoa jurídica revela-se imprescindível para a busca dos verdadeiros e reais autores dos delitos quando imputados à pessoa moral, sendo que a produção das provas da ocorrência do trust é deveras problemática, posto que tanto um (settlor) como outro (trustee) mantém, no mais das vezes, contrato firmado (trust agremment ou trust deed & memorandum of wishes) para a não delação da sua existência, constituindo um pacto secreto entre ambos, mediante remuneração, agindo o comissionário em seu próprio nome e sob sua rubrica exclusiva age sem que ninguém tenha conhecimento da existência do pacto anterior.
Dito isto, somente é possível descobrir exatamente as pessoas envolvidas no trust quando existir deslizes praticados por uma ou outra parte, como documentos trocados entre as partes, e-mails, mensagens, telefonemas, etc.
Não se pode examinar o trust com a mesma cautela que se examina outros delitos empresariais, eis que, neste tipo de contrato, especificamente, haverá de prevalecer a prova indiciária da existência do contrato, lembrando que a prova de qualquer contrato pode ser feita por meio de indícios suficientes, como se vê do art. 239 do Código de Processo Penal.
É com base nos deslizes de uma ou outra parte do trust que se consegue descobrir a ocorrência de eventuais crimes precedentes, mesmo porque tanto a existência do trust como os participantes desejam o sigilo como forma de acobertar sua ocorrência.
Bem, até o momento estou me referindo ao trust legalmente aceito pela legislação inglesa e amplamente difundido nas suas colônias, sendo que outras pessoas jurídicas podem utilizar o "modelo" do trust para práticas delinquentes, como veremos a seguir.
Por isso, nos Estados Unidos da América o conceito de "organização" ou "associação" acabou por ser estabelecido por uma norma federal, a U.S. Federal Sentencing Guidelines Manual, 18 U.S.C.S. Appx, § 8A1.1 (205), cujos termos incluem as corporações, parceiros, associações, joint-stock companies, uniões, trusts, fundos de pensões, organizações não governamentais, entre outros, tudo isso para evitar a ocorrência de crimes de money laundry.
Ao longo do tempo pudemos observar que as organizações criminosas seguem exatamente o modelo do trust do direito inglês, criando as empresas de fachada para a lavagem de capitais ou de ativos financeiros, sendo que não é crível encontrar-se nos mais diversos rincões mundiais pessoas jurídicas nitidamente criminosas, envolvidas com os mais diversos setores da vida social, como se fossem empresas constituídas para e por meios lícitos, quando não o são.
No entanto, curioso é convir que os países não estão imunes e não criaram mecanismos seguros de combate às pessoas jurídicas encarregadas da prática de crimes, embora as legislações de diversos países prevejam sanções somente quando as mesmas estiverem envolvidas em delitos, produzindo uma série de práticas criminosas, inclusive o terrorismo, que assola a todos.
Apenas para se ter uma ideia, nas Ilhas Virgens Britânicas para uma população de 16.000 habitantes, aproximadamente, há mais de 87.000 empresas offshores ali instaladas.
Do mesmo modo, a punição no caso de trust inglês se não se conhecer os termos dos contratos ou se não se conseguir identificar os verdadeiros parceiros comerciais ou pessoas designadas, também, não se terá condições de punir severamente os reais autores dos crimes praticados quer pelas físicas quer pelas pessoas jurídicas criminosas, posto que estas sejam utilizadas pelos verdadeiros mandantes para tais fins ilícitos, sem que apareçam nas cenas criminosas.



[1] Settlor – pessoa que entrega ou transfere seus bens para terceiros gerir.

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